PROSPERIDADE
A festa estava pronta! A expectativa de todos estava demonstrada no rosto dos fiéis que estavam á espera do “grande homem de Deus”. O coração e a conversas entre os músicos era de conhecer aquela próxima figura que adotariam como um exemplo a ser seguido. As músicas foram selecionadas conforme a “campanha do pregador”, sim, nessa época os cânticos ainda eram voltados pra Deus, e foi difícil achar no repertório alguma música que enaltecesse as vantagens humanas em detrimento da vontade de Deus.
E lá nós estávamos tocando quando chegou e atrasado o pregador. Juro pela vida de vocês que quando o cara botou o pé na lateral do degrau daquela querida igreja, o espetáculo estava pra começar, e os palhaços todos sempre sabem quem são, os fiéis sinceros e inocentes, ou ingênuos. E todos sabem que os pregadores que vem de outra cidade sempre atrasam para criar aquele clima de David Coperfild. Fica meio mágico se é que me entendem.
Bom! O terno da figura era capaz de fazer tremer e rachar o solo da Itália e garanto que não daria para costurar de novo. Cabelo bem aparado, o gel brilhava mais que as botas da Madonna, e a gravata mais colorida que o arco-íris? Bem mais. O anel que ele tinha “era vidro e se quebrou”, não ele valia mais que todas as roupas do “corpo de obreiros” daquela cidade. E desde a maneira de pegar o microfone até as nuances da voz eram cuidadosamente escolhido para engodar os ouvintes.
Resumindo. Ele arrancou dinheiro de todos, como quem colhe chá de macela na semana da páscoa. Juro que naquela noite enquanto estava naquele púlpito tive vergonha de ser músico cristão. Ele levou até o carro de um mano da Ilha da Pintada. O cara pintou o 7. Arrancou o olho do parceria e ainda lambeu o buraco. Tirou o dinheiro até dos músicos, ou seja, ele era bom, pois pra arrancar grana de músico, tem de fazer milagre. Ele intimou todos os músicos individualmente, e eu era o último na fila dos moicanos. Pensei que ele iria pular minha vez, como aqueles malucos que pulam as setes ondas, não deu, eu era o sétimo músico e era o número que ele tava usando para a “campanha da prosperidade”, dele é claro.
Eu tinha acabado de comprar uma pedaleira pra guitarra, mas vi nos olhos do pregador me fitava como quem olha os quadros de Da vinci, e queria me hipnotizar. E até o avô do Neto, que era o sobrenome dele, devia ter virado no caixão de vergonha. Até que ele viu que de “mim não saia virtude”, mas não desistiu e me perguntou: “Você tem fé?”, não queria envergonhá-lo e disse em tom de desistência e teimosia: “Teeenho”. “Do tamanho de um grão de mostarda?”. Pensei...”claro tou na frente dum gigante”, mas fiz só...”hãm hãm”. Ele disse: “Tem cheque?”. Pensei, pensei e vi que ele deu em mim um cheque-mate. Baita jogador. Toda a igreja me olhando, me senti um grãozinho de mostarda, peguei o talão, pensei num valor bem alto, dobrei e multipliquei por sete, que era o tema da mensagem séu...intelecto, juro que temi. Quando preenchi e ele olhou o valor, parece que ele viu a glória eterna, seus olhos brilharam como o cristal, quem lê entenda. Ele devolveu-me o cheque, desistiu? Não, disse-me fora do microfone: “Assina, tu esqueceu de assinar!” O cara era fera mesmo.
Até hoje não consigo lembrar se no lugar da assinatura escrevi: “deus lhe pague” ou “tenha fé” e deve ter até hoje o cheque, mate.
Isso foi a quinze anos atrás, e vi que a “teologia da prosperidade” cresceria e sufocaria a prosperidade da teologia. E sabem o que significa prosperidade? Liberdade, pois é, li no livro de Salmos que “Deus trás os cativos (presos) á prosperidade (liberdade). Que assim seja.
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